Rocky Tango (23 anos, guitarra e voz, aka “Rock Assassino”), Dedos Tubarão (17 anos, baixo e coros), Jorge Lee Finuras (guitarra 18 anos, aka “Punhos de Renda”) e Gato Dinamite (19 anos, bateria) formaram, em Fevereiro de 1978, uma das primeiras bandas Punk portuguesas, que a par com os Aqui D'El Rock protagonizaram alguns momentos inesquecíveis do Rock em Portugal.
O Punk Rock tinha começado na Inglaterra no ano anterior e as duas bandas referidas importaram o fenómeno para Portugal.
Se os Aqui D'El Rock chegaram a gravar dois singles, os Faíscas de Dedos Tubarão não deixaram nenhum registo discográfico para a posteridade. Há apenas um registo sonoro de uma actuação ao vivo, que consegui descobrir na “net”.
Os Faíscas tiveram como uma espécie de “manager” Zé Pedro que viria a formar os Xutos & Pontapés. O seu primeiro concerto aconteceu em Lisboa, no 1.º Festival da Revista "Música & Som", no dia 31 de Março de 1978, onde tocaram 13 temas, durante uma hora (de clássicos de Chuck Berry, Bill Halley ou Elvis Presley como "Roll Over Beethoven", “Johnny B. Good”, “Rock Around The Clock” ou “Long Tall Sally” a temas originais como "Não Perdes Pela Demora", “Quero-te Agradecer”, “Sábado À Tarde” “Radiodifusão” ou "Faca Na Barriga").
Tocam muito em Lisboa, no “Bar É” ou na boite “Browns”, sozinhos ou com os UHF, Minas & Armadilhas (duas bandas que surgiram depois) e os “contemporâneos” Aqui D’El Rock. Muitos dos concertos eram organizados pelos próprios membros da banda. Editavam um “fanzine”, também intitulado “Faíscas”.
O grupo dura pouco tempo (terminou em Janeiro de 1979), mas ainda faz alguns espectáculos pelo país em Espinho, Setúbal, Canas de Senhorim e Castro Marim.
Em 29 de Abril de 1978 houve um Festival em Lisboa, com os Elo e os Aqui D’El Rock. Os Faíscas, como não foram convidados, invadiram o palco e pediram para tocar. Conseguiram tocar durante dez minutos, antes de serem expulsos do palco. No dia 27 de Maio de 1978 (há quase trinta anos- como o tempo foge- parece que foi na semana passada), os Faíscas deram um concerto no Cine – Teatro do Sabugal, que ficou na memória de todos quantos a ele assistiram, não tanto pela música, mas pelas peripécias associadas a tal espectáculo. Foi uma noite de Punk a valer que incluiu tudo o que se associa a um espectáculo Punk.
O concerto estava marcado para as 22 horas, mas os Faíscas só apareceram depois da meia-noite. Os Faíscas tinham-se comprometido a tocar com a aparelhagem do grupo de baile local chamado Stradivarius, trazendo apenas as guitarras.
Chegaram num Fiat 127 (no documentário “Brava Dança”, sobre os Heróis do Mar, que já passou na RTP, Pedro Ayres refere este concerto, assinalando que se deslocaram numa Renault 4, mas eu lembro-me que era um Fiat 127 branco), acompanhados por um motorista mais velho.
Entraram para o recinto e, como ninguém os conhecia, foi-lhes pedido o dinheiro do bilhete, ao que eles responderam “Faíscas” e seguiram, sem darem mais cavaco a ninguém.
Comeram frango assado no balcão do Cine-Teatro e atiraram com os ossos para a plateia, enquanto o grupo Stradivarius tocava alguns temas. Provocação e atitude eram algumas das suas imagens de marca.
Foram depois para um bar da vila onde pediram cafés duplos e compraram uma garrafa de bagaço, para beberem durante a actuação.
Imaginem o que era aquela gente de aspecto Punk num café de uma vila do Interior do país, alguns com brincos na orelha, coisa nunca vista por estes lados!!! Um escândalo.
Voltaram ao Cine-Teatro e iniciaram o concerto. Havia pouca gente. O facto de terem chegado tarde fez muita gente debandar, incluindo o fotógrafo que poderia ter tirado umas fotos, hoje históricas. Mesmo assim a “movida” toda do Sabugal e arredores estava presente. Muitos dos presentes apresentavam-se trajados, também, de forma bastante Punk e provocatória. Alguns jovens com gravata e outra indumentária Punk. Também presentes estavam jovens da Guarda e até de Celorico da Beira. Punks a tocar nunca tinha havido por estes lados!!!
Os Faíscas começam a tocar e, passado pouco tempo, têm início uma série de provocações entre o público e a banda. Rocky Tango tocava com o “jack” da guitarra todo esticado. O amplificador lá atrás e ele aos saltos de um lado para o outro, no palco. Os Faíscas gostavam de tocar bem perto do público. Os concertos dos Faíscas tinham uma energia muito rara. Em Portugal não havia banda com tanta energia como os Faíscas.
Dedos Tubarão usava uma “t.shirt” onde tinha escrito a esferográfica “Musa, a tua ausência é o despertar da minha angústia”.
Lembro-me de tocarem muito Rock’N’Roll, temas como “Roll Over Beethoven” ou “Rock Around The Clock”. Dos temas em português é que guardo poucas memórias, mas sei que alguns deles tinham letras bem provocatórias.
De repente um espectador cospe no baixista. Este ameaça o espectador. Trocam-se uma série de insultos. Ele sai do palco e tenta tirar satisfações. Depois tudo acalma e o espectador oferece-lhe uma cerveja. O baixista Dedos Tubarão (hoje famoso) só diz “mas pagas tu, mas pagas tu!”.
A organização, devido à chegada tardia dos Faíscas, estava com problemas financeiros. Então os membros da banda andavam sempre atrás do rapaz que tinha o dinheiro para receberem. Este dava-lhes algum “cacau” e mandava-os tocar mais um pouco. E foi assim a noite toda. Tocavam três ou quatro temas e vinham pedir as “coroas” (o termo que eles utilizavam).
Sei que aquilo terminou e fiquei lá no recinto a noite toda. Fiz uma directa, com outros jovens que estavam lá, também. No dia seguinte, de manhã, recorremos à boleia para ir para casa, que ficava a 16 km.
Alguns dos presentes que tinham tomado “speeds” e até comprimidos para dormir (devido à falta de “outro material”) regressaram a casa, mal o concerto terminou, sabe-se lá como.
Pelo menos dez (!!!) deles vieram na cabine de uma camioneta de carga, marca Saviem. Como lá couberam todos é que ninguém consegue explicar. O condutor da camioneta teve que fazer a viagem de 16 km com a porta aberta (!!!!) Mas todos chegaram sãos e salvos. Alguns, mal chegaram a casa, dormiram no primeiro canto que encontraram, sem se preocuparem em encontrar a cama, tal a dose de comprimidos para dormir que tinham tomado.
E foi assim este concerto inesquecível. De certeza que nenhum dos presentes esqueceu, jamais, esse concerto.
De músicos Punk até aos dias de hoje, os elementos que constituíram os Faíscas continuam a dar cartas na música portuguesa. Efectivamente, Dedos Tubarão é Pedro Ayres Magalhães dos Corpo Diplomático, Heróis do Mar , Madredeus e Resistência; Gato Dinamite é Emanuel Ramalho, que foi baterista dos Corpo Diplomático, Street Kids, Rádio Macau, Delfins e João Pedro Pais, entre outros e Rocky Tango é Paulo Pedro Gonçalves, dos Corpo Diplomático, dos Heróis do Mar, dos LX 90, dos Kick Out The Jams e dos Ovelha Negra.
AGRADEÇO A QUEM TIVER RELATOS DE CONCERTOS INESQUECÍVEIS COMO ESTE DOS FAÍSCAS ,NO SABUGAL, QUE ME ENVIE POR E-MAIL QUE EU PUBLICO AQUI NO BLOG
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7 comentários:
Não resisti a 'roubar' a referência e a publicar no Billy News...
Parabéns, transmite bem o feeling da altura...
Fizeste bem , Billy
Excelente descrição de época - tinha quinze anos mas lembro-me bem do que se passava no país, e a sua narrativa é perfeita. Embora na altura já não vivesse em Lisboa, voltava lá duas a três vezes por ano e nessa altura o "zeitgeist" era tal qual o descreve. Deliciosos os pormenores sobre o concerto do Sabugal!! O punk português foi tardio e diminuto mas tinha cá uma garra! Os meus mais sinceros parabéns pela sua prosa!
No youtube, existe o áudio que eu coloquei do programa Rotação do António Sérgio.
Aristides:
Esqueceste-te de referir que em resposta às cuspidelas e às provocações dos Faísca, o pessoal foi ao mercado, ao lixo deixado pelas vendedoras a buscar os tomates podres e atiraram ao grupo...
Não vi isso, caro anónimo
Ola armistices eu Estava présente n'es
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